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3/09/2019

PARÓQUIA:  REDE DE COMUNIDADES

(Por Pe. Pedro F. Bassini – Revista Pastoral)


“A conversão da Paróquia em comunidade de comunidades consiste em ampliar a formação de pequenas comunidades de discípulos convertidos pela Palavra de Deus e conscientes da urgência de viver em estado permanente de missão. O discípulo de Jesus Cristo percebe que a urgência da missão supõe desisntalar-se e ir ao encontro dos irmãos (Documento da CNBB, 100).
Suas características principais são:

a) Descentralização
b) Empoderamento dos fiéis
c) Ministerialidade
d) Consciência de pertença

e) Poder-serviço
f) Missionariedade

g) Transformação social

a) Descentralização (o conselho de Jetro a Moisés, Ex 18,13-27). A vida eclesial se desenvolve na comunidade, e a matriz, em sentido pastoral, torna-se apenas uma comunidade. Embora conserve o poder jurisdicional canônico, é apenas uma instituição jurídica e de serviço à rede de comunidades que a compõe em seu território prescrito. O poder não está centralizado na matriz e no pároco, e sim no conselho que rege a rede: o conselho pastoral paroquial, formado com representantes oficiais de cada comunidade, basicamente sua coordenação. As decisões são sempre colegiadas tanto para a rede como para cada comunidade, que conta com o seu conselho comunitário pastoral. Este é formado pelas forças vivas da comunidade: líderes nas pastorais, nos movimentos e nas associações de cunho tanto religioso quanto político-social. Essa descentralização compreende uma interdependência funcional das comunidades entre si e com o pároco, que se torna o animador da rede paroquial. Com isso, a comunidade torna-se sujeito na evangelização e não apenas objeto, em que um líder descarrega sua fala sobre o evangelho ou outro assunto qualquer de cunho religioso.

b) Empoderamento dos fiéis. Fica eliminada a clássica divisão clero-leigos: a Igreja ao clero, o mundo aos leigos. Todos os fiéis, exercendo a missão batismal, são corresponsáveis na evangelização, cada um no seu lugar e ministério, ordenado ou não ordenado, organizados para a funcionalidade do todo eclesial. Essa mentalidade gera o respeito a cada membro da comunidade, que se sente acolhido e integrado ao corpo comunitário e sabe do seu direito e do seu dever. Para isso, o plano de pastoral paroquial vai contemplar grande espaço de tempo para o estudo, favorecendo a formação em todos os níveis de organização do povo nas comunidades. Dessa forma, fica clara a visão do Vaticano II sobre a Igreja povo de Deus (LG=Luz para os povos 308). Do nível da assistência passa-se ao nível de participante, integrante, celebrante. A espiritualidade encarna na vida e será exercida em qualquer lugar e função que se desenvolva, pois o fiel é Igreja por onde ele passa, e 

seu testemunho torna-se visível pelo seu comportamento vivencial. Cessa a dependência e se cria a intercomunhão, que possibilita o diálogo maduro em todos os níveis. Na dependência, funciona a submissão e a escravidão; só na autonomia a liberdade pode ser exercida. Nesse sentido, empoderamento é devolver ao outro o direito que ele tem de sustentar uma relação em nível de pessoa, com sua característica pessoal, ou seja, no seu jeito de ser.

c) Ministerialidade. Uma Igreja toda ela ministerial significa ir às fontes do cristianismo, resgatando o jeito de viver o evangelho nas primeiras comunidades e o adaptando às exigências reais deste tempo na sua culturalidade; mas o princípio é o mesmo, basta conferir as cartas apostólicas no que diz respeito à vida da comunidade. O exemplo disso é a comparação que o apóstolo Paulo faz da comunidade com o corpo (1Cor 12,12-31). Há uma variedade de membros, cada um com sua função definida, porém na unidade do corpo e todos os membros em prol do mesmo corpo. O corpo só funciona bem se seus membros estiverem funcionando bem. Cada um no seu posto e o todo vai bem. O diferente não atrapalha, mas complementa e desenvolve diferentemente uma função que completa a harmonia. Diferentes, mas todos igualmente importantes e respeitados em sua função. São ministérios de serviço e não resguardam privilégios, sentem-se realizados enquanto servem e o ganho final é sempre do corpo inteiro. O ministro não apresenta um show com base em seus talentos nem está interessado em aplausos que elevem seu orgulho pessoal. O que vale é o “com-junto” (junto com). Por ministério entendemos um serviço institucionalizado e continuado que faz existir a comunidade, pois todo ministério existe para a comunidade, ele é essencialmente comunitário, aí ele nasce e se desenvolve.

d) Consciência de pertença. O batismo insere a pessoa no seguimento de Cristo numa comunidade. Na Igreja primitiva, os convertidos passavam pelo batismo e daí em diante testemunhavam o Ressuscitado, mudavam seu comportamento vivencial e, mesmo que por causa desse modo de viver fossem levados ao martírio, dificilmente trocavam o comportamento, renegavam o nome recebido. “Vestiam a camisa”, defendiam a causa, propagavam com a própria vida e em qualquer ambiente testemunhavam. A fé modelava a vida. Essa é a MINHA comunidade; eu SOU essa comunidade. Se ela vai bem ou mal, depende também de mim, e, quando critico, é para fazê-la progredir. A consciência de pertença é o enraizamento da pessoa na comunidade; bem
enraizada, ela está segura e pode circular por vários ministérios e serviços sempre com a mesma disponibilidade e alegria. Como sinais concretos de pertença, podemos definir: a presença responsável, a frequência às atividades – celebrações e eventos –, o compromisso com o dízimo, a colaboração nas necessidades extraordinárias e o estudo para alargar os conhecimentos eclesiais.

e) Poder-serviço. Aqui, os membros da comunidade se embasam no testemunho de Cristo, que “não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate” (Mt 20,28). Estamos falando da autoridade moral, que se faz respeitar pela força interna da alma e não pela ditadura da lei ou pela força das armas. O poder-serviço nunca tem medo do diálogo e aceita na mesa de conversação qualquer tipo de assunto em busca do que seja melhor para a comunidade, sem, porém, abrir mão da ética e da caridade. O poder que não é serviço exclui assuntos e, para não sair do mando, foge. Aplica a lei com parcialidade para beneficiar-se das definições. Põe-se acima do bem e do mal, é sempre um juiz definidor. Mas Deus se fez serviço (Lc 17,10). Pelo poder-serviço nunca se buscam privilégios, ganhos ou lucros – “serve enquanto serve” e continuará sempre servindo, pois descobriu que nesse sistema está a alegria e toda a realização humana. Não é um trabalho com remuneração, mas é a aplicação da gratuidade na graça. Isso enobrece a alma.

f) Missionariedade. Na comunidade, a missão não é um ministério ou um serviço temporário que uma pessoa determinada desenvolve. É a razão de ser da comunidade. A missão da Igreja é evangelizar, e isso não significa só falar do evangelho. Toda a comunidade é missionária enquanto vive o evangelho no jeito de Jesus. Se alguém é designado para uma função fora da comunidade, nunca vai para mostrar seu talento pessoal. O que faz, o faz em nome da comunidade que o enviou. Normalmente, essas funções são desenvolvidas em duplas ou equipes, justamente para salientar o aspecto comunitário. Para ser missionário, primeiro se precisa ser discípulo. No discipulado está o aprendizado. Aprender a tomar a cruz de cada dia para estar seguro do
seguimento. Por isso, a teologia da cruz tem lugar de destaque na comunidade. Pois ela não se reúne para efetuar curas ou milagres nem para fazer shows. O seu marketing é a cruz da qual pendeu a salvação do mundo. A comunidade deve ser tão grande, que nela caibam todas as realidades existentes em seu território, inclusive afetivo, mas deve ser tão pequena, que todos os membros se conheçam e ninguém fique escondido ou excluído. Por isso, quando o número de fiéis aumenta muito, é hora de exercer a missão e fundar outra comunidade para não perder a irmandade. Com isso, multiplicam-se as lideranças, favorece-se a presença, expandem-se os sinais testemunhais. A comunidade é missionária em si mesma e para fora de si. Aonde quer que vá um fiel formado nessa mentalidade, seu compromisso é ser comunidade, inserindo-se em uma já existente ou formando outra.

g) Transformação social. Em uma paróquia centralizadora ou de massa, sua periferia ficará sempre abandonada, e justamente os pobres, pelos quais o Cristo fez opção preferencial, continuam desamparados. Transformação social está ligada com Reino de Deus. O objetivo da vivência da fé, ou da evangelização, é fazer que a sociedade seja justa, fraterna e solidária. Implantando comunidades em todo o território social, cria-se a estrutura para a dinâmica do reinado. Muitas realidades eclesiais perderam a ligação com esse objetivo. Centram toda a pregação no reinado pós-morte e na vivência individual dos valores morais do tipo “salva a tua alma!” Quando Jesus anunciou o Reino, quis garantir um lugar de vivência saudável para a humanidade. Por
isso, a comunidade não está ocupada apenas com a dimensão espiritual da pessoa, mas quer cuidar também do corpo dessa pessoa e do lugar onde esse corpo, essa pessoa, habita. Trabalhar politicamente para as melhorias físicas do bairro onde reside é genuína evangelização; promover o bem comum, cuidar dos bens que pertencem a todos, é evangelização; ajudar o outro a ser mais feliz é evangelização; defender a ética na política, no comércio e nas relações interpessoais é evangelização; denunciar a corrupção e todas as falcatruas é evangelizar. Toda espiritualidade que não leva o fiel a esse comportamento não vem de Deus.

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