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5/11/2019

DEUS SEMPRE NOS SURPREENDE

AS SURPRESAS DE DEUS

 O anúncio do anjo a Maria (Lc 1,26-38) vem depois do anúncio do anjo a Zacarias (Lc 1,5-25). Nos dois casos anuncia-se um nascimento. Vale a pena comparar os dois anúncios para perceber as semelhanças e as diferenças. Descrevendo a visita do anjo a Maria e a Isabel, Lucas evoca as visitas de Deus a várias mulheres estéreis do Antigo Testamento: Sara, mãe de Isaque (Gn 18,9-15), Ana, mãe de Samuel (I Sam 1,9-18), a mãe de Sansão (Jz 13,2-5). A todas elas o anjo tinha anunciado o nascimento de um filho com missão importante na realização do plano de Deus. E agora, ele faz o mesmo anúncio a Isabel, esposa de Zacarias, e a Maria. Maria não é estéril. Ela é virgem. No Antigo Testamento, o anjo de Deus, muitas vezes, é o próprio Deus.

A Palavra de Deus chega a Maria não por meio de um texto bíblico, mas através de uma experiência profunda de Deus, manifestada na visita do anjo. Foi graças à ruminação da Palavra de Deus da Bíblia que ela foi capaz de perceber a Palavra viva de Deus na visita do anjo.

Lucas não fala muito sobre Maria, mas aquilo que fala tem grande profundidade. Quando fala de Maria, ele pensa nas comunidades. Apresenta Maria como modelo para a vida das comunidades. É na maneira de ela relacionar-se com a Palavra de Deus que Lucas vê a maneira mais correta para a comunidade relacionar-se com a Palavra de Deus: acolhê-la, encarná-la, vivê-la, aprofundá-la, ruminá-la, fazê-la nascer e crescer, deixar-se moldar por ela, mesmo quando não a entendemos ou quando ela nos faz sofrer. Esta é a visão que está por trás dos textos dos capítulos 1 e 2 do Evangelho de Lucas, que falam de Maria, a mãe de Jesus.
Quando Lucas fala de Maria, ele pensa nas comunidades do seu tempo que viviam espalhadas pelas cidades do império romano. Maria é, para ele, o modelo da comunidade fiel. Descrevendo a visita de Maria a Isabel, ele ensina como aquelas comunidades devem fazer para transformar a visita de Deus em serviço aos irmãos e irmãs.
O episódio da visita de Maria a Isabel mostra ainda outro aspecto bem próprio de Lucas. Todas as palavras e atitudes, sobretudo o Cântico de Maria, formam uma grande celebração de louvor. Parece a descrição de uma solene liturgia. Assim, Lucas evoca o ambiente litúrgico e celebrativo, em que as comunidades devem viver a sua fé.
O texto Lc 1,39-56 nos fala da visita de Maria a sua prima Isabel. As duas eram conhecidas uma da outra. E, no entanto, neste encontro elas descobrem, uma na outra, o mistério que ainda não conheciam e que as encheu de muita alegria. Hoje também encontramos pessoas que nos surpreendem com a sabedoria que possuem e com o testemunho de fé que nos dão.
Lucas acentua a prontidão de Maria em atender as exigências da Palavra de Deus. O anjo lhe falou da gravidez de Isabel e, imediatamente, Maria se levanta para verificar o que o anjo lhe tinha anunciado, e sai de casa para ir ajudar a uma pessoa necessitada. De Nazaré até as montanhas de Judá são mais de 100 quilômetros! Não havia ônibus nem trem.
O Segundo Livro de Samuel conta a história da Arca da Aliança. Davi quis colocá-la em sua casa, mas ficou com medo e disse: “Como virá a Arca de Javé para ficar na minha casa?” (2 Samuel 6,9). Davi mandou que a Arca fosse para a casa de Obed-Edom. “E a Arca de Javé ficou três meses na casa de Obed-Edom, e Javé abençoou a Obed-Edom e a toda a sua família” (2 Samuel 6,11). Maria, grávida de Jesus, é como a Arca da Aliança que, no Antigo Testamento, visitava as casas das pessoas trazendo benefícios. Ela vai para a casa de Isabel e fica lá três meses. E enquanto está na casa de Isabel, ela e toda a sua família são abençoadas por Deus. A comunidade deve ser como a Nova Aliança. Visitando a casa das pessoas, deve trazer benefícios e graça de Deus para o povo.
A atitude de Maria frente à Palavra expressa o ideal que Lucas quer comunicar às comunidades: não fechar-se sobre si mesmas, mas sair de si, sair de casa, e estar atentas às necessidades bem concretas das pessoas e procurar ajuda na medida das necessidades.
Em Lucas 2,8-20 temos a visita do anjo aos pastores anunciando o nascimento do Salvador. E o sinal do reconhecimento é este: “Vocês vão encontrar um recém-nascido, envolto em faixas e  deitado numa manjedoura!” Surpresa grande! Eles esperavam o Salvador de todo o povo e encontram um recém-nascido pobre, deitado num coxo de animal!
Deixe Deus lhe surpreender. Ele se manifesta nas coisas pequenas e conhecidas. Quando as coisas são muito conhecidas a gente já não presta tanta atenção. Assim acontece com a visita de Deus em nossas vidas. Ela é tão presente e tão contínua que, muitas vezes, já não a percebemos e, por isso, perdemos uma grande oportunidade de viver na paz e na alegria.


 (Baseado no livro O Avesso é o lado certo – Carlos Mesters e Mercedes Lopes )

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