Marcelo Barros
Monge beneditino e escritor - 04.10.12
Aparentemente, uma coisa nada tem a ver a outra. Principalmente em uma cultura que separa a espiritualidade da vida real, o exercício de votar parece um hábito apenas político, enquanto a espiritualidade é reduzida ao religioso. De fato, a Política e a Espiritualidade são campos mais abrangentes e uma interage profundamente com a outra. Temos de redescobrir e valorizar a dimensão política da espiritualidade, assim como a busca espiritual se manifesta no modo de exercer o compromisso político.
O Concilio Vaticano II afirmava que Deus não quis nos salvar individualmente, mas nos unir em comunidade (Lumen Gentium 2). Por isso, a política é uma arte sublime e importante.
Em um belo artigo, Frei Gilvander Moreira escrevia: "Somos seres políticos”, já dizia Aristóteles. Ingenuidade dizer: "Sou apolítico. Não gosto de política. Sou neutro.” Todos nós fazemos Política o tempo todo. Política é como respiração. Sem respiração, morremos. Política refere-se ao exercício de alguma forma de poder, como nos ensina Bertold Brecht em "O Analfabeto Político”. A política, como vocação, é a mais nobre das atividades. Como profissão, a mais vil.(ver www.adital.org.br).
Para votar nessas eleições com coerência espiritual é preciso ser dócil ao Espírito de Deus em nós e não seguir critérios de interesse pessoal, de família, ou votar apenas por relação de amizade. Como diz uma campanha popular: "Voto não tem preço. Tem consequências”.
O nosso voto pode ajudar a construir uma sociedade mais justa; ou pode, ao contrário, perpetuar os velhos vícios do sistema vigente.
No Brasil, muitos políticos que pareciam éticos e coerentes, hoje revelam claramente ter trocado um projeto de país por um mero projeto de poder pessoal ou partidário. Entretanto, seja como for, todos os políticos e partidos não são iguais ou equivalentes. Mesmo se, em muitos casos, ainda somos obrigados a votar no menos pior, é importante discernir entre as diversas escolhas possíveis, a escolha que nos parece ser a mais justa e adequada para o bem comum.
Os Evangelhos contam que, ao entrar em Jerusalém, Jesus foi ao templo e ali, com um chicote em punho, expulsou os cambistas e vendedores de animais para os sacrifícios. Embora esse gesto profético tivesse o sentido de anunciar uma nova relação com Deus sem templo e sem sacrifícios, essa cena pode servir como símbolo para a vida de hoje. A política como atividade espiritual pode ser vista como um novo templo divino, porque é o espaço formador da dignidade coletiva de um povo. Por isso, é preciso expulsar dela os vendedores que a aviltam. Hoje, o chicote com o qual podem ser expulsos da política os que a reduzem a um negócio de interesse e mercado só pode ser o voto consciente e ético de cada cidadão/ã. O evangelho diz que devemos julgar as pessoas e partidos conforme a prática e pelos seus resultados. "Pelos frutos bons, vocês podem discernir que a árvore é boa, assim como pelos maus frutos, verão que uma árvore é má. Pelos frutos, vocês podem discernir se a árvore é boa ou má” (Mt 7, 18).
FONTE: Eleições e espiritualidade. Brasil de fato. Disponível em: <http://www.brasildefato.com.br/node/10797> Acesso em: 05 out. 2012.
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